Este projecto tem como enquadramento geral a Hipótese do Contacto (Allport, 1954) e a Teoria da Identidade Social (Tajfel, 1982) e tem dois objectivos principais:
1) Estudar o desenvolvimento de atitudes e comportamentos preconceituosos em crianças contra os seus pares de minorias estigmatizadas. A questão mais problemática na compreensão do desenvolvimento do preconceito na infância tem sido o "formato" desse percurso. A abordagem contemporânea dominante (Aboud, 1988) defende que o desenvolvimento de competências cognitivas na infância é determinante para o declínio da expressão do preconceito a partir dos 7 anos, a abordagem sócio-normativa (França & Monteiro, 2004; Rutland et al., 2005) defende a importância das normas sociais no desenvolvimento do preconceito ao longo da vida, sendo a ausência de expressão do preconceito nas crianças a partir dos 7 anos um efeito da pressão da norma anti-racista, que apenas afecta as expressões directas, mas não indirectas, de preconceito, tanto na infância como na idade adulta. Para testar a influência conjunta da pressão normativa (França, Rodrigues, Monteiro & Rutland, 2006) e das competências cognitivas (Aboud, 1988) na expressão do preconceito são desenvolvidos dois estudos experimentais que utilizam medidas implícitas e explícitas do comportamento preconceituoso, de modo a desocultar os efeitos controversos da pressão normativa e da audiência. Para esclarecer os processos responsáveis pelos fenómenos em estudo, serão incluídas como variáveis mediadoras e moderadoras da relação entre o desenvolvimento cognitivo (idade), a pressão normativa (tipo de audiência) e as expressões preconceituosas, as competências cognitivas (meta-percepções da inibição do comportamento de discriminação) e sócio-cognitivas (percepção da norma anti-racista e capacidade de adoptar a perspectiva de outrem).
2) O papel do estatuto dos grupos na redução do preconceito inter-étnico e na generalização de atitudes positivas em relação ao exogrupo.
Torna-se cada vez mais claro que os movimentos migratórios deveriam ser alvo de maior atenção, de modo a integrarem informação sobre a diversidade cultural e as consequências do encontro de diferentes grupos na vida das sociedades. Nesta linha de preocupações, a psicologia social das relações entre grupos tem vindo a desenvolver modelos de redução dos efeitos negativos da categorização intergrupal nos adultos (Allport, 1954; Gaertner & Dovidio, 2000). A possibilidade de reduzir a discriminação intergrupal na infância utilizando o quadro teórico da TIS só recentemente recebeu a atenção dos investigadores, não sendo ainda compreensível qual o padrão de representação dos grupos que melhor consegue alterar o comportamento preconceituoso inter-étnico. Na sequência de estudos anteriores (Rebelo et al., 2005; Guerra et al., 2005; Monteiro et al., 2006), este projecto desenvolve três estudos para testar a eficácia relativa de dois modelos de redução do preconceito– o Modelo da Identidade Endogrupal Comum (IEC) e o modelo da Dupla Identidade (DI) (Gaertner & Dovidio, 2000)- com efeitos estimados directos na situação de interacção entre os grupos e a longo prazo em relação a todo um exogrupo. De modo a identificar os processos mediadores e as variáveis moderadoras do efeito destes modelos na redução do preconceito e na generalização das atitudes positivas aoexogrupo, os desenhos em estudo integram a assimetria de estatuto (Branco e Negro), a prototipicalidade e a percepção de distintividade dos grupos. Esta última variável é especialmente relevante para a distinção entre os efeitos da Identidade Endogrupal Comum e da Dupla Identidade: enquanto na primeira a recategorização visa a indução de uma nova categoria supra-ordenada e o esbatimento das fronteiras das categorias iniciais, na segundo a recategorização visa a indução de uma nova categoria supra-ordenada, a par da manutenção das fronteiras das categorias iniciais, sendo a distintividade dos grupos o ingrediente crucial na redução do preconceito.
A generalização das atitudes positivas conseguidas através de manipulações do ‘formato’ dos grupos durante a interacção constitui um objecto de estudo teórico e empírico importante, uma vez que os programas de intervenção dirigidos à redução da discriminação inter-étnica obterão benefícios importantes do esclarecimento acerca, não só da potência imediata dos modelos para reduzir o preconceito nas interacções na escola, mas da sua potência a médio prazo para garantir a melhoria das relações inter-étnicas em geral.
No seu conjunto, estes estudos visam alargar a compreensão do desenvolvimento e da redução do preconceito na infância, assim como elucidar os processos e as variáveis explicativas, tanto das expressões flagrantes e subtis do preconceito ao longo da infância, como da construção de relações intergrupais mais igualitárias entre grupos de estatuto social assimétrico. A utilização de medidas implícitas e explícitas do preconceito constitui um valor metodológico adicional para o esclarecimento destas questões.